Florianópolis - Faculdade de Medicina

O lance é nunca se permitir entrar na zona de conforto. Quando a gente se desafia e se manda pro desconhecido coisas incríveis acontecem. Só quem vive, sabe: pra sentir a vida pulsando e a mente se abrindo, tem que se permitir. 

E foi pensando nisso que eu decidi deixar Buenos Aires por um tempo e passar 5 meses viajando e vivendo em lugares diferentes. A escusa é estagiar em hospitais mundo afora, começando pelo Hospital Universitário da UFSC (HU), em Florianópolis (SC), Brasil. 

Fiquei 1 mês estagiando no setor de Emergência do HU. 1 mês atendendo pacientes em um idioma diferente do que eu estudei (os erros de gramática ficarão para sempre registrados nos prontuários do HU, hehe), me adaptando a um sistema de saúde novo e conhecendo uma Faculdade de Medicina diferente da minha.

Uma das minhas primeiras impressões foi sobre o curso de Medicina em si. Já na primeira semana de estágio percebi que no BR* os alunos de Medicina são mais amparados do que os da AR** durante sua fase prática da faculdade (o chamado "Internato" no BR e ''Ciclo Clínico" na AR). As turmas são bem menores do que as da UBA e os alunos são melhores distribuídos nos Hospitais-Escola. Dessa forma, as práticas são realizadas em pequenos grupos de mais ou menos 5 pessoas, ou até mesmo em duplas, como é o caso da Emergência do HU. Neste serviço, cada aluno tem pelo menos 3 médicos que estão sempre à disposição pra discutir os casos clínicos, a conduta terapêutica, os resultado de exames, a evolução dos pacientes internados, etc. O resultado dessa educação mais próxima é uma impressionante uniformidade em relação aos alunos. Todos atendem, prescrevem e fazem procedimentos da mesma forma, com praticamente o mesmo nível de conhecimento e experiência. Aqui, não depende da sua força de vontade ou interesse, nem do seu promédio da carreira, ou de quão responsável você é, nem de quantos plantões por fora você decidiu fazer pra ganhar experiência. Aqui, sair da faculdade pronto não depende só de você, tem toda uma estrutura organizada que garante isso.

Entendi então, que estudar em uma universidade pública de verdade - que não restringe o acesso e não impõe número de vagas - como a UBA, é motivo de grande orgulho, mas tem o seu preço. O grande número de alunos por turma diminui a qualidade de aprendizagem e a oportunidade de ganhar experiência ainda na condição de praticante. Essa ''falha'' alarga o tempo dedicado a aprender, retardando o momento em que finalmente alcançamos autonomia como médicos. Isso explica, em parte, porquê na AR as residências duram no mínimo 4 anos e no BR a grande maioria das residências duram apenas 2 anos. 

Ver a diferença entre os dois sistemas educacionais é preocupante mas entendê-la é libertador. Não me intimido em apontar as diferenças que considero negativas porque fica claro que se trata de um tipo de sistema de educação que funciona na AR desde sempre. Sistema esse que também existe em países europeus como a Alemanha e Portugal, onde os alunos só participam de forma observacional nas consultas médicas e tem residências ainda mais longas do que na AR. Em todos estes, os médicos continuam sendo excelentes. Agora, cabe a mim escolher a qual deles quero me adaptar. 

        ~ a possibilidade de escolha só é real quando nos permitimos entender outras realidades, 
                                  o resto é só o sistema te conduzindo e decidindo por você ~ 

*Aqui, me refiro especificamente aos alunos de Medicina da UFSC.
*Aqui, me refiro especificamente aos alunos de Medicina da UBA.

Comentarios

Entradas populares